O
contrato administrativo encerra uma forma de colaboração entre a Administração
e os particulares por via bilateral, nos casos em que a Administração faz uso
do mecanismo da contratação e contenha actos de gestão pública que ficam
submissos ao direito administrativo, ou seja, “funções materialmente
administrativas”. O art.º 179.º do CPA encerra uma norma e habilitação em
matéria de celebração de contratos administrativos, reproduzindo o art.º 9º/1
do ETAF – podemos definir o contrato administrativo como o acordo de vontades
pelo qual é constituída, modificada, extinta uma relação administrativa. Sendo
uma relação administrativa aquela que confere poderes de autoridade ou impõe
restrições justificadas pelo interesse público levada a cabo pela Administração
perante particulares ou impõe deveres a estes perante ela. O Direito Europeu é
imprescindível na avaliação da contratação pública, começando a sua disciplina
a desenvolver-se em 57 com o Tratado de Roma – pesando embora, o facto de não
ter nenhuma manifestação directa do que concerne à contratação pública introduz
alguns princípios que vêm nortear as primeiras directivas nos anos 60, que vão
sendo sucessivamente reformados em ciclos de cerca de dez anos, acompanhando a
integração europeia e as vicissitudes da época. Os anos 60 são caracterizados
por uma intervenção minimalista, com regimes europeus para apenas alguns
contratos públicos e apenas algumas entidades – inicialmente estes contratos
eram as empreitadas, a aquisição de bens e só mais tarde a prestação de
serviços; e as entidades eram o Estado e a Administração Pública Clássica
(pessoas colectivas de direito público, em oposição com os sectores excluídos
das águas, transportes, energia e telecomunicações. As regras destes regimes
acentuavam essencialmente sobre os procedimentos pré-contratuais, impondo a
realização de concursos com inúmeras excepções e exclusões. Existe
essencialmente a consagração de princípios baseados na regulação do bem-estar
entre operadores económicos, garantindo a concorrência e a igualdade,
estipulando-se as liberdades essenciais do projecto europeu. Ao longo do tempo
dá-se um alargamento subjectivo na aplicação destas directivas, passando a ser
aplicadas as entidades privadas que actuem em colaboração com a administração,
isto essencialmente nos anos 80. Existe um alargamento dos regimes dos
contratos que passam a ficar submetidos ao direito europeu, surgindo novos
contratos. Nomeadamente sectores especiais com regimes próprios menos
exigentes, mas sujeitos a directivas europeias. Podemos destacar o caso
específico da Directiva recursos de 89 que vem prever tanto procedimentos como
antes acontecia, mas, também, impor que haja meios de impugnação e de recurso
das decisões que sejam contrárias ao direito europeu (tem uma revisão com
versão de 2007). Em 2004, são inseridas as concessões de obras públicas, sem
que tenham a mesma consagração as concessões de prestação de serviços. Em 2009,
consagra-se um regime especial em matéria de compras em matéria militar.
Hoje
o direito nacional e europeu consagra os Princípios da livre circulações de
mercadorias, liberdade de estabelecimento, livre prestação de serviços,
igualdade, não discriminação, reconhecimento mutuo, proporcionalidade,
transparência e concorrência – diz-nos JOÃO CAUPERS. A enunciação dos
princípios do art.º 1º/4 do CCP parece entender-se como não necessária por via
da sua contemplação no CPA (art.º 3º a 12º); Chegando ESTEVES DE OLIVEIRA a
formar opinião no sentido de estes serem mesmo desnecessários pela sua pré
consagração em sede constitucional. -> não podendo negar que se deve aplicar
os restantes princípios do CPA não enunciados no CCP. M. REBELO DE SOUSA diz
que outros princípios têm de ser aplicados: tutela da confiança, força
vinculativa contratual e objectividade e JORGE ANDRADE E SILVA parte de uma
aplicação em esquema tripartido: princípios relativos à actuação
administrativa; princípios do procedimento administrativo (aplicam-se a
quaisquer procedimentos adjudicatórios); e princípios especiais dos
procedimentos pré-contratuais (que se aplicam aos procedimentos de adjudicação
dos contratos públicos). Primordial é o Princípio da Concorrência (art.º 10
RJRDPCP) – obrigando, em principio, a que seja adoptado um procedimento de
adjudicação de contrato publico, decorrendo do principio da liberdade economia,
do livre acesso à contratação e à igualdade de tratamento na mesma. Tem como
corolários a exigência de comparabilidade de propostas e candidaturas; o
princípio da intangibilidade/imutabilidade das propostas (art.º 69) ; a
estabilidade do concurso; e a estabilidade subjectiva dos concorrentes.
Preceitua-se hoje ainda uma diferença entre contrato público e contrato administrativo,
os marchés publics: contrato público – art.º 1º/2 CCP reduzidos aos contratos
de prestação de serviços, , fornecimento, empreitada de obra publica, concessão
de serviços e concessão de obra publica – operando uma “dualidade conceptual
ezquizófrénica” para VASCO PEREIRA DA SILVA. Interessa referir a boa doutrina
de MARIA JOÃO ESTORNINHO que apontava quanto aos contratos administrativos
várias fases de um requiem: candura, atrito e convivência civilizada-
propugnando um sentido convergente entre contrato administrativo e contrato de
direito privado da administração: complexo exorbitante dos tradicionais
contratos administrativos, a publicização da actividade de direito privado da
administração. Não se pode considra hoje que as prerrogativas exorbitantes da
administração não se apliquem aos contratos de direito privado da mesma, poder
de interpe das cláusulas, fiscalização, direcção unilateral, rescisao
unilateral. Esta concepção afasta-se daquilo que era a doutrina tradicional
portuguesa que se preocupava com a origem orgânica das partes contratantes, a
sua natureza enquanto entidade pública, para agora, com base no direito
europeu, passar a interessar-se pelo facto jurídico contratual que é formado
por uma entidade adjudicante: na doutrina portuguesa seriam uma categoria
contratual geral celebrada pelo estado, em que os contratos administrativos
seriam uma sua espécie sujeita ao direito administrativo, a par de outras
realidades não administrativas como os contratos constitucionais, os tratados e
convenções internacionais, contratos fiscais, financeiros (FREITAS DO AMARAL) –
levando MARIA JOÃO ESTORNINHO a dizer que a concepção derivada da doutrina
francesa de contrato público morreu (derivando na inexistência hoje da
concepção de contrato administrativo enquanto aqueles celebrados entre a
administração e os particulares ou pessoas colectivas, com base em poderes de
autoridade, como colaboração subordinada no dizer de MARCELLO CAETANO. Doutrina
mais tarde recusada por FREITAS DO AMARAL, SÉRVULO CORREIA, ESTEVE DE OLIVEIRA
E GUILHERME DA FONSECA, apontando alguns que a lei não era taxativa, não sendo
a enumeração do antigo 815/2 um carácter taxativo nem naquilo que concernia ao
efeito contencioso; o que não impedia, mesmo que taxativamente em matéria de contencioso,
que existissem outros contratos substancialmente administrativos Questão
definitivamente resolvida com a entrada em vigor do ETAF e do CPA, sendo hoje
uma delimitação teleológica e não orgânica na senda da prossecução e interesses
públicos e submissão ao direito administrativo). No caso dos contratos
administrativos que podiam ser objecto de direito privado e não são por opção
das partes existe uma divergência doutrinaria em que JOÃO CAUPERS diz que passa
a ser contrato administrativo aquilo que os contraentes assim quiserem e
MARCELO REBELO DE SOUSA que diz que esta escolha só é possível quando a
administração dispuser de um poder discricionário que lhe permita a escolha
entre a “prossecução de interesses públicos por contrato administrativo ou
direito privado” (contratos públicos...). Questão interessante é a que pergunta
se podem existir contratos administrativos entre duas pessoas de direito
privado. A doutrina francesa e alemã tem seguido nesse sentido, com base num
conceito amplo que comporte qualquer modificação, criação ou extensão d uma
relação jurídica de direito administrativo. Para FREITAS DO AMARAL a relação
administrativa é definida com base em poderes de autoridade ou restrições de
interesse publico à administração, atribuindo deveres e impõe direitos aos
particulares; consagrando uma excepção aquilo que é o regime regra do direito
privado do art. 406/1 CC → aquilo que era o regime do art.º 180 CPA. Quanto à
validade dos contratos a L. 134/98 de 15 de Maio, vem consagrar o recurso de
contencioso através de um novo meio processual acessório que se reconduz às
medidas provisórias contra actos administrativos relativos à formação de
contratos da AP, que não eram necessariamente administrativos, que tivessem por
objecto fornecimentos ocasionais de bens e contratos de prestação de serviços
que não visassem fins de imediata utilidade publica, o que Sérvulo Correia na
sua doutrina já defendia pela sua tipificação enquanto administrativos, passan
definitivemente a estar subjugado aos tribunais administrativos, contrariamente
à exepção presente em sede do ETAF (artº 9º). Com a Reforma 2002 da Justiça
Administrativa tem-se como ausente a expressão de contrato administrativo e
alguns autores propuseram mesmo a adopção do termo contratos públicos, por
exemplo, M. JOÃO ESTORNINHO, AFONSO DE OLIVEIRA MARTINS E CARLOS CADILHA. O CCP
opera a transposição das directivas 2004/17/CE e 2004/18/CE – fundamentalmente
referentes a procedimentos pré-contratuais; JOÃO CAUPERS diz “bem se pode dizer
que o código teve dois legisladores, um comunitário outro nacional”; concentra
direito objectivo e adjectiva, mantendo em vigor diversa legislação avulsa.
Historicamente,
resultam duas imposições das directivas relativas ao processo dos actos
praticados no decurso do procedimento que visam a celebração de contratos (só
alguns – art. 100º/1)
Qualquer
acto pré-contratual pode ser impugnado neste processo não sendo necessário que
tenha a natureza jurídica de acto administrativo. É ainda passível de
impugnação a adjudicação do contrato mas como tal é um acto administrativo o
CPTA nem o referiu.
Existe
um desvio estes actos do âmbito da acção administrativa especial – os actos
impugnados neste processo urgente não pode ser impugnado na acção
administrativa especial. Tal como os actos relativos a contencioso eleitoral,
os actos de contencioso pré contratual são inimpugnáveis na acção
administrativa especial.
Este
processo também não é um processo estritamente impugnatória, sendo que os
tribunais administrativos já tem reconhecido a possibilidade de extensão deste
processo aos actos de condenação à pratica de acto devido.
Note-se
que nos termos do art. 100º/3, basta que o litigio esteja incluído no âmbito da
jurisdição administrativa para ter também de se aplicar este contencioso pre
contratual urgente mesmo que uma das partes seja particular (ao contrario do
que sucede no contencioso eleitoral que só se aplica a entidades públicas).
Quanto
aos pressupostos do contencioso pré-contratual aplicam-se as regras gerais
previstas para a acção administrativa especial pois existe uma remissão para o
regime da impugnação de actos administrativos, donde surge o problema nos casos
em que se efectue um pedido de condenação à pratica de um acto devido.
Nos
termos do art.101º a impugnação intentada no prazo de um mês a contar da
notificação dos interessados ou não havendo lugar a notificação na data do
conhecimento do acto permite afastar a regra geral que estabelece 3 meses nos
termos do 58º/2.
Outra
questão que se coloca é a de saber se o art. 58º/2 CPTA apesar de se referir
que não há prazo para os actos nulos se também se aplica aos anuláveis. As
opiniões na doutrina dividem-se: MÁRIO AROSO DE ALMEIDA segue a orientação do
STA e entende que tanto se aplica aos actos nulos como anuláveis.
Como
ANDRÉ SALGADO DE MATOS defende um acto nulo não deve estar sujeito a um prazo
de impugnação uma vez que estes não produzem quaisquer efeitos jurídicos.
Estando o acto ferido de nulidade este não se pode estabilizar na ordem
jurídica. Conclui assim que este prazo é apenas para os actos administrativos
que tenham um prazo de impugnação geral.
Quanto
à Tramitação do Contencioso Pré-Contratual apresenta particularidades
relativamente a acção administrativa especial, nomeadamente no que diz respeito
às alegações que se assemelham à do contencioso eleitoral, existe uma redução
de prazos (20 dias), por outro lado o artigo 63.º permite ampliar o objecto do
processo e verificando-se a
impossibilidade de dar pretensão ao pedido do autor, o tribunal pode julgar
improcedente o pedido em causa (não procede a sentença requerida, mas convida as
partes a acordar o montante da indemnização. Além da impossibilidade absoluta o
art. 45º prevê ainda a situação de tal gerar um grave prejuízo para o interesse
publico este não existe no art. 102º/5 porque a estabilidade do interesse
publico pressupõe o decurso do tempo, e este processo é urgente.
De
acordo com o 103.º o processo termina com audiência.
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Curso de direito dos contratos públicos : por uma contratação pública
sustentável / Maria João Estorninho. - Coimbra : Almedina, 2012. -O poder de modificação
unilateral do contrato administrativo, quando exercido pela administração : e
as garantias contenciosas do seu co-contratante perante este exercício /
Lourenço B. Manoel de Vilhena de Freitas. - Lisboa : AAFDL, 2007. - Dissertação
de mestrado em Ciências Jurídico-Políticas apresentada na Faculdade de Direito
da Universidade de Lisboa em 2002 - Contratos sobre o exercício de poderes
públicos : o exercício contratualizado do poder administrativo de decisão
unilateral / Mark Bobela-Mota Kirkby. - Coimbra : Coimbra Editora, 2011. - A
formação dos contratos públicos : uma concorrência ajustada ao interesse
público. - Lisboa : AAFDL, 2013. - Tese de doutoramento em Ciências
Jurídico-Políticas, apresentada na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa,
2012. -O contencioso administrativo no divã da psicanálise : ensaio sobre as
acções no novo processo administrativo / Vasco Pereira da Silva. - 2ª ed.. -
Coimbra : Almedina, 2009.
Manuel Saraiva n.º
149113703
Ricardo Ferreira n.º
140110120