Principais diferenças entre o Conselho de Estado Francês e o Administrative Court Inglês
Como vimos nas aulas anteriores de
Contencioso Administrativo, os modelos de Contencioso Administrativo Francês e
Inglês actualmente tendem a aproximar-se um do outro, apesar de terem nascido
bastante diferentes.
Hoje em dia,
os órgãos mais importantes responsáveis pelo controlo da Administração Pública
em França e em Inglaterra são, respectivamente, o Conselho de Estado (le
Conseil d´État) e o Administrative Court. Mas afinal o que é o Conselho de
Estado e o Administrative Court fazem? Será que as funções destes dois tribunais
diferem ou podemos estabelecer semelhanças entre os dois órgãos no que respeita
às suas funções? São estas questões que irei analisar de seguida, referindo
quais são as competências do Conselho de Estado Francês e do Administrative
Court Inglês.
Começando pelo Administrative Court,
verificamos que este tribunal tem competência em várias matérias.
Primeiro que tudo, o Administrative
Court é um tribunal administrativo de primeira instância que controla a actuação da
Administração Pública inglesa e galesa e serve de órgão supervisor de outros
“tribunals” e “ courts”.
A jurisdição supervisória do Administrative Court é
exercida sobretudo através de um mecanismo processual chamado “ judicial
review” e abrange instituições que exercem funções públicas. Cabem dentro do
Judicial Review as decisões de
autoridades públicas no exercício dos seus deveres que atribuem vários
benefícios sociais e educação especial a crianças, certas decisões das
autoridades de imigração e da Immigration Appellate Authority, decisões de
órgãos de regulação e decisões que digam respeito a direitos de
prisioneiros.
O Administrative Court pode
funcionar com um único juiz ou como uma secção (com dois ou mais juízes).
Apesar de o Administrative Court estar dentro da “ Queen´s Bench Division” no
exercício da “ judicial review”, os juízes da secção de família e da chamada “
Chancery division” (que trabalha com Direito Empresarial, Direito
Testamentário, Insolvência e Direitos Reais) do tribunal judicial de primeira
instância também participam neste tribunal.
Actualmente, o
Administrative Court tem a sua sede em Londres e lida com o judicial
review em decisões de “ courts” e “ tribunals” inferiores, instituições
públicas e entidades que exercem funções públicas. Também linda com recursos
contra decisões de magistrados de tribunais, pedidos de habeas corpus, recursos
de decisões de Ministros, do poder local e dos tribunais, pedidos para evitar que uma
das partes continue os procedimentos sem a autorização de um juiz e pedidos
relacionados com o Coroners Act de 1988.
Alguns assuntos podem ser ouvidos
por uma secção do Administrative Court composta por dois ou mais juízes, entre
os quais constam pedidos relacionados com eleições parlamentares e para o
Governo local segundo os Representation of People Acts.
E quanto ao Conselho de Estado
Francês? Quais são as suas principais funções?
Importa dizer que o Conselho de
Estado Francês tem três principais funções: aconselha, julga e administra.
De facto, a primeira função do
Conselho de Estado é aconselhar o Governo. Para isso, o Conselho de Estado
utiliza secções especializadas: a secção do interior, a secção de finanças, a
secção de obras públicas, a secção social e a secção de administração, esta
criada em 2008. O Conselho de Estado aconselha o Governo na
preparação de projectos de lei, de ordonnances e de alguns decretos, emite
pareceres sobre questões jurídicas e realiza, a pedido do Governo ou por
iniciativa própria, estudos sobre questões administrativas ou políticas
públicas.
Em segundo lugar, o Conselho de
Estado julga a Administração em França, pois é este órgão que, em última
instância, controla a actuação do poder executivo francês, das
coletividades territoriais, das autoridades independentes e dos
estabelecimentos públicos administrativos e dos organismos que dispõem de
prerrogativas de poder público.
Em terceiro lugar, o Conselho de
Estado é responsável pela gestão dos 41 tribunais administrativos franceses, das 8 cortes
administrativas de apelação e de algumas jurisdições especializadas (dentre as
quais a Corte Nacional de direito de asilo).
Para gerir os magistrados, o
Conselho de Estado é auxiliado por um órgão de consulta independente, o
Conselho Superior dos Ttribunais administrativos e das cortes administrativas
de apelação (CSTA).
Em suma, através da atribuição ao
Conselho de Estado de uma dupla função jurisdicional e consultiva, podemos
dizer que este órgão faz com que a Administração Pública Francesa se submeta ao
Direito e evita que, como acontecia na fase do Pecado Original em França, fosse
a Administração Pública a
controlar-se a si própria.
Assim sendo, embora o Conselho de
Estado Francês e o Administrative Court tenham atribuições diferentes, devemos
concluir que o principal objectivo destes dois tribunais é igual : o
controlo da Administração Pública e a defesa dos direitos dos particulares face
ao poder público. De facto, sem o Conselho de Estado Francês e sem o
Administrative Court britânico, o controlo da Administração Pública e a defesa
dos direitos dos particulares em França e em Inglaterra seriam tarefas muito
mais difíceis de concretizar e o controlo do exercício da função administrativa
acabaria sempre por ser insuficiente nestes países. Daí que seja da opinião de que
estes dois órgãos jurisdicionais, embora com composições e atribuições
diferentes, sejam essenciais em França e em Inglaterra para evitar que a
Administração Pública actue a seu bel-prazer desrespeitando os direitos dos particulares.
Guilherme Gomes
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