quinta-feira, 24 de outubro de 2013

O Direito de Acção Popular

Importa, em primeiro lugar, saber qual a origem desta acção. E a resposta dada por vários autores a esta questão, é que a acção popular corresponde à actio popularis, existente no Direito Romano, através da qual, era atribuída ao cidadão romano a legitimidade para interpor acções, que visassem a protecção dos interesses públicos.
Isto releva, pois o nosso ordenamento jurídico sempre foi beber muito ao Direito Romano, e a acção popular não é excepção, visto que se foi desenvolvendo tendo por base esta influência.  Todavia, foi depois da Revolução Francesa, já no século XIX, que começaram a surgir algumas consagrações do direito de acção popular, nos direitos nacionais.

Entre nós, mais concretamente, na Constituição de 1976, na sua versão original, foi consagrado o direito de acção popular. Hoje, podemos encontrar este direito no artigo 52º3 da Lei Fundamental. Trata-se de um instrumento de participação e intervenção democrática dos cidadãos na vida pública, de fiscalização da legalidade, de defesa dos interesses das colectividade e de educação e formação cívica de todos. Desta forma, é então consagrada uma forma peculiar de participação dos cidadãos – individual ou colectivamente organizados -, na preservação e defesa de valores fulcrais, por pertencerem à mesma sociedade, a uma mesma colectividade.
A acção popular apresenta-se assim, como um meio jurisdicional que consagra um “direito de acção judicial” como expressão do Direito de Acesso aos Tribunais, consagrado no artigo 20º da Constituição da República Portuguesa, onde a legitimidade para a respectiva propositura foi consideravelmente alargada, visto que até à revisão de 1989, o direito de acção popular, consagrado então no artigo 52º, só podia ser exercido por cada cidadão individualmente considerado.

Em segundo lugar, importa olhar à forma como a acção popular se desenvolve no Contencioso Administrativo.
Com a Lei 15/2002 de 22 de Fevereiro, esta consagrou-se no Código do Procedimento dos Tribunais Administrativo, que a partir deste momento será designado por CPTA. Este “novo” Contencioso, trouxe algumas alterações ao já conhecido regime da Acção Popular, nomeadamente pela revogação expressa do artigo 822º Código Administrativo.
Após a entrada do novo CPTA, o regime da Acção Popular modificou-se, podendo, nos termos do artigo 9º2 do CPTA, verificar-se que, atendendo à legitimidade activa das partes, esta é atribuída, independentemente de haver interesse pessoal na demanda. Esta legitimidade é destinada à defesa de valores e bens constitucionalmente protegidos, como a saúde pública, o ambiente, o ordenamento do território, a qualidade de vida, os bens do Estado, entre outros.
Dentro da acção popular verificamos que existem duas modalidades: uma prevista no artigo 9n.º2 e outra prevista no artigo 55º2, ambos do Código do Procedimento dos Tribunais Administrativos.
A primeira diz respeito, a acções que podem ser intentadas em defesa de valores e bens constitucionalmente protegidos do Estado, das Regiões Autónomas e das Autarquias Locais. Já a segunda modalidade, é a chamada Acção Popular Local, a qual se refere à impugnação de actos administrativos praticados por órgãos autárquicos, que qualquer cidadão, desde que esteja recenseado, pode intentar – artigo 55º2CPTA.

Em terceiro lugar, importa determo-nos sobre a legitimidade para a defesa dos interesses difusos, constante no artigo 9º2CPTA.
Neste artigo, deparamo-nos com um fenómeno de extensão da legitimidade. Este preceito, tem em vista o exercício por parte dos cidadãos, do direito de acção popular para defesa dos valores e bens constitucionalmente protegidos – o qual é reconhecido pela Constituição da República Portuguesa, como um direito fundamental de participação política.
O exercício de poderes, e a intervenção previstos no citado artigo, processa-se nos termos previstos na lei. Ora, esta remissão tem em vista a Lei nº83/95, de 31 de Agosto.
Esta remissão dá-nos dois planos. Primeiro, o plano da Legitimidade - o alcance de atribuir legitimidade para a defesa dos Interesses Difusos, aos sujeitos aí referidos, desde que estes preencham os requisitos estalecidos no artigo 3º da referida Lei. Daqui retira-se que não existe qualquer ligação da situação de apropriação individual do interesse difuso lesado, enquanto critério para assegurar o exercício do direito de acção popular por qualquer cidadão. No que diz respeito às Associações e Fundações, a sua legitimidade activa, compreende os bens ou interesses cuja defesa esteja incluída no âmbito das suas atribuições.
E em segundo, temos o plano Processual – em que o legislador entendeu que os processos, quando intentados nestas circunstâncias apresentariam especificidades que justificariam a adaptação ao modelo de tramitação normal, que se encontra descrito e previsto nos artigos 13º e seguintes da Lei 83/95.
Importa por último, explicar o que se entende por Interesses Difusos. Estes podem entender-se como interesses de todas as pessoas integrantes de uma comunidade, pelo simples facto de o serem, são interesses individuais, mas indisponíveis e inseparáveis da pertença de uma comunidade. Os interesses difusos são, assim, direitos que pertencem a todos e a ninguém; os bens sobre os quais incidem estes interesses, podem ser gozados por todos, visto que não são susceptíveis de apropriação exclusiva.

Dito isto, resta retirar as seguintes conclusões: (1) O direito de acção popular reúne as características necessárias para, depois de regulamentando e aplicado, ser um instrumento de realização da democracia participativa; (2) este direito é um meio por excelência da tutela dos interesses difusos; (3) a atribuição deste direito, adquire relevância quando os critérios normais de atribuição de legitimidade não são suficientes para assegurar a efectivação da tutela judicial de certos interesses, permitindo alargar a legitimidade processual a cidadãos, individual ou colectivamente organizados.

Sara Rodrigues da Costa, nº 140110123

Bibliografia:
  • MÁRIO AROSO DE ALMEIDA - “Manual de Processo Administrativo”, Almedina, 2010;
  •  VASCO PEREIRA DA SILVA, “O Contencioso Administrativo no Divã da Psicanálise – Ensaio sobre as Acções no Novo Processo Administrativo”, 2ª Edição;
  •  JOSÉ CARLOS VIEIRA DE ANDRADE, “A Justiça Administrativa”, 12ªEdição.

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