terça-feira, 3 de dezembro de 2013

CONTESTAÇÃO

Caros colegas,

Anexamos a contestação, enviada às 23h59 para os Juízes.
Infelizmente, não conseguimos publicar aqui a prova documental.

Cumprimentos,

A defesa da Ministra



Tribunal Administrativo e Fiscal do Círculo de Lisboa

Proc. N.º 9241/13.1YXLSB
Exmo. Sr. Dr. Juiz de Direito

MINISTÉRIO DA AGRICULTURA E DO MAR, sedeado na Praça do Comércio, 1149-010, Lisboa, Ré. nos autos à margem melhor identificados, notificada da petição inicial apresentada, vem expor e requerer o seguinte:


DOS FACTOS

1.º
Não se acrescenta novos factos ao processo.


DO DIREITO

I.                   DO PLANO PROCESSUAL
A)    DA FALTA DE PATROCÍNIO JUDICIÁRIO

2.º
Nos termos do artigo 11.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (doravante designado “CPTA”), o patrocínio judiciário releva como pressuposto processual uma vez que a constituição de advogado é obrigatório nos processos de competência dos tribunais administrativos.

3.º
O regime aplicável a este pressuposto é o referido nos artigos 40.º e seguintes do Código de Processo Civil (doravante designado “CPC”), por força da remissão prevista no artigo 1.º do CPTA.

4.º
Na petição inicial (doravante designada “PI”), não existe qualquer referência à representação do Autor (doravante designado “A.”) por advogado(s), devidamente credenciados por cédula profissional, pelo que se presume que o mesmo se faz representar por pessoas que não possuem os conhecimentos técnicos exigidos para o efeito.

5.º
Neste caso, é aplicável o artigo 41.º do CPC, cuja estatuição determina a absolvição do réu da instância para os casos de falta de constituição de advogado.

6.º
Mesmo admitindo, sem conceder, que foi constituído advogado, o artigo 48.º do CPC seria sempre aplicável, uma vez que a parte contrária não juntou procuração aos autos. Assim, todos os actos praticados pelo mandatário ficam sem efeito até ao suprimento e correcção do referifo vício.

7.º
Caso não seja suprida esta irregularidade, estaremos perante um fundamento que obsta ao prosseguimento do processo como prescreve o artigo 89.º do CPTA, que contém uma enumeração meramente exemplificativa. Esta consequência resulta dos artigos 576.º/2 e 577.º/h), este último qualificando a falta de constituição de advogado e a falta de procuração como excepções dilatórias.

8.º
Acresce que este é um caso de representação sem poderes (falta de poderes stricto sensu), nos termos do artigo 268.º do Código Civil (doravante designado “CC”), pelo que os actos  praticados em representação do A. são ineficazes em relação a este, se não forem por ele ratificados.

9.º
Face ao supra exposto, pede-se ao Meritíssimo Juiz de Direito a absolvição do R. da instância.


B)    DO PEDIDO DE DECLARAÇÃO DE ILEGALIDADE COM FORÇA OBRIGATÓRIA GERAL DO REGULAMENTO ANIMAL DOMÉSTICO

10.º
Não estão preenchidos os pressupostos que permitem lançar mão deste meio processual, designadamente, a recusa de aplicação da norma em três casos concretos, com fundamento na sua ilegalidade – art. 73.º/1 do CPTA.

11.º
De facto, até à data de entrega da presente contestação, não houve  qualquer decisão jurisdicional de recusa de aplicação do regulamento, com fundamento na sua ilegalidade.

12.º
Note-se que o A. se limitou a alegar a verificação do pressuposto enunciado no art. 73.º/1 do CPTA (v. articulado 65 da PI); cabendo-lhe ainda o ónus de o provar – art. 342.º/1 do CC.

13.º
Nestes termos, conclui-se que o pedido formulado pelo A. não deve prosseguir (art. 73.º/1 do CPTA).

14.º
Sem conceder, mas querendo o tribunal conhecer do pedido de ilegalidade do Regulamento, remete-se para os articulados 53.º e seguintes a demonstração da sua validade.  


C)    DO PEDIDO DE CONDENAÇÃO DO MINISTÉRIO NO PAGAMENTO DE UMA INDEMNIZAÇÃO DE € 30.000 POR DANOS NÃO PATRIMONIAIS E DOS JUROS MORATÓRIOS QUE À TAXA LEGAL SE VENCEREM SOBRE TAL QUANTIA DESDE A CITAÇÃO ATÉ INTEGRAL E EFECTIVO PAGAMENTO

15.º
No que respeita aos pedidos de indemnização por facto ilícito, a causa de pedir é um facto complexo, correspondendo aos pressupostos da responsabilidade civil extracontratual constantes da Lei n.º 67/2007, de 31 de Dezembro (Lei da Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e Demais Entidades Públicas; doravante designada “Lei n.º 67/2007”).

16.º
Tendo isto em consideração, não se pode dizer que a PI preencha o requisito indicado no art. 78.º/1/g) do CPTA, designadamente por não ser suficientemente clara na exposição dos fundamentos de facto e de direito relativos ao pedido de responsabilidade civil.

17.º
Esta confusão resulta, desde logo, do articulado 48 da PI, na qual o A. invoca como causa de pedir para o pedido em análise um “ilícito administrativo decorrente da emissão do Regulamento Animais Domésticos” (doravante designado “RAD” ou simplesmente “Regulamento”).

18.º
Perante a insuficiência e, por vezes, ininteligibilidade da exposição do A., conclui-se pela ineptidão da PI, ao abrigo dos arts. 78.º/2/g) e 89.º/1/a) do CPTA.

19.º
Mesmo admitindo, sem conceder, que a PI não é inepta, nunca poderia dar-se como verificada a existência de ilicitude, culpa, dano e nexo causal.

20.º
Nesta demonstração, partir-se-á da presunção de que o facto que o A. pretende fazer valer como fundamento da sua pretensão é o Regulamento emanado pela Ré (doravante designada “R.”) – facto este cuja verificação não se contesta.

21.º
Em primeiro lugar, quanto ao pressuposto da ilicitude, deve dar-se por não verificado em virtude de o regulamento ser plenamente válido – como procurará demonstrar-se adiante (v. articulados 53.º e segs.).

22.º
Do mesmo modo, não pode dar-se como verificada a culpa da Ministra, pelo menos, nos termos formulados pelo A..

23.º
Não é, efectivamente, verdadeira a afirmação segundo a qual a Ministra emanou o regulamento com intenção de agir em contravenção da lei, considerando-se, pelo contrário, que a diligência empregue na adopção do RAD foi absolutamente correspondente àquela a que a Ministra da Agricultura e do Mar e os demais serviços competentes do seu Ministério se encontravam obrigados no exercício das suas funções – art. 8.º/1 da Lei n.º 67/2007, a contrario.

24.º
Demonstram-no o relatório estatístico requerido pelo Ministério ao CEIPCRPP – CENTRO DE ESTATÍSTICAS INDEPENDENTE PARA CONFUSÕES RELACIONADAS COM O PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE, Lda., bem como o Business Plan requerido a um gestor independente e o parecer de um jurista de renome (conforme DOCS. 2 e 3, 4 e 5, e 6 e 7, cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido para os devidos e legais efeitos).

25.º
Quanto ao nexo de causalidade, o mesmo também não está verificado.

26.º
Na aferição deste pressuposto, serão tidos em conta o facto “Regulamento” e as “mazelas físicas sofridas pelo A.” (v. articulado 50 da PI).

27.º
Note-se que a própria PI indicia a não verificação do nexo causal, ao referir-se aos danos não patrimoniais como tendo sido “sofridos pelo A. em virtude do acidente” e da “morte dos animais” (v. articulado 50 da PI).

28.º
Efectivamente, o regulamento não é, em concreto, causa do dano, uma vez que as “mazelas físicas sofridas pelo A.” não se devem à discussão que se gerou em torno do Regulamento – caso em que não seria tão desprovida de sentido a afirmação da existência de um “nexo de causalidade em cadeia” –, mas ao acidente vascular cerebral sofrido pelo A. (v. articulado 8 da PI).

29.º
Ora, os acidentes vasculares cerebrais (AVC) não decorrem de fervorosas e polémicas discussões (v. articulado 5), mas do entupimento ou rompimento de vasos sanguíneos originado pela idade avançada, tabagismo, diabetes, colestrol elevado, entre outros factores de risco. 

30.º
Assim, não é defensável que os “múltiplos ferimentos corporais, escoriações e um traumatismo craniano” tenham sido causados, ainda que indirectamente, pelo Regulamento.

31.º
Eles não foram sequer causados pela discussão em torno do Regulamento; mas, como os médicos vieram a constatar e como alegado pelo próprio A. (v. articulado 8 da PI), por um AVC.

32.º
Mesmo admitindo, sem conceder, que o Regulamento pudesse ter sido, em concreto, causa do dano, ele não é, em abstracto, segundo o curso normal das coisas, causa da produção dos danos não patrimoniais alegadamente sofridos pelo A.

33.º
De facto, não se pode dizer que a emanação de regulamentos pela Administração seja, por sua natureza, adequada à produção de ferimentos corporais, escoriações e traumatismos cranianos (v. articulado 6 da PI).

34.º
Por tudo o acima exposto, conclui-se que não estão reunidas as condições de prosseguimento do pedido [arts. 78.º/2/g) e 89.º/1/a) do CPTA] e, caso o juiz assim não considere, de procedência do mesmo.


D)    DO PEDIDO DE CONDENAÇÃO DO MINISTÉRIO NO PAGAMENTO DE UMA INDEMNIZAÇÃO DE € 20.000 POR DANOS PATRIMONIAIS E DOS JUROS MORATÓRIOS QUE À TAXA LEGAL SE VENCEREM SOBRE TAL QUANTIA DESDE A CITAÇÃO ATÉ INTEGRAL E EFECTIVO PAGAMENTO

35º
Repetir-se-á, em parte, o que já se disse relativamente à análise do pedido de condenação no pagamento de uma indemnização por danos não patrimoniais (v. articulados 14.º a 33.º da presente contestação).

36.º
Novamente, considera-se que a causa de pedir não é formulada de forma adequada, pelo que a PI é inepta e o pedido do A. não deverá prosseguir – arts. 78.º/1/g) e 89.º/1/a) do CPTA.

37.º
Note-se que também vale para este pedido a formulação “ilícito administrativo decorrente da emissão do Regulamento Animais Domésticos” (v. articulado 48 da PI), que já acima criticámos.

38.º
Ainda que o juiz assim não considere, nunca poderiam dar-se como verificados os factos constitutivos do direito pretendido pelo A.  

39.º
Presumindo – da petição inepta – que o facto alegado pelo A. é a emanação do Regulamento, não estão verificadas a ilicitude e a culpa da Ministra, remetendo-se para o que já se disse nos articulados 18.º a 23.º da presente contestação.

40.º
Diferentes, neste pedido, são os pressupostos do dano e, consequentemente, o nexo de causalidade, os quais, ainda assim, não estão verificados.

41.º
Para justificar que não há nexo de causalidade, serão tidos em conta o facto “Regulamento” e os danos patrimoniais referentes à morte dos animais pertencentes ao A..

42.º
Note-se que, mais uma vez, o A. não afirma, em concreto, a verificação do nexo de causalidade, limitando-se a afirmar que “o regulamento era em termos abstractos e foi-o em concreto idóneo à provocação dos danos”.

43.º
Desde logo, um regulamento desta natureza não é, em abstracto, segundo o curso normal das coisas, causa adequada à redução, por morte, dos animais pertencentes aos destinatários das suas normas.

44.º
Seguindo o pensamento do A., também o Hospital onde nasceu a Ministra seria responsável pelos danos patrimoniais relativos à morte dos animais.

45.º
Ainda quanto à não verificação do nexo de causalidade, retoma-se a ideia segundo a qual o Regulamento não foi, em concreto, causa da produção do dano, uma vez que, como já se disse, não foi a discussão gerada em torno do Regulamento que causou o internamento (que, segundo o A., deu causa aos danos), mas o AVC sofrido pelo A..  
Remete-se, neste ponto, para aquilo que já se defendeu nos articulados 24.º a 32.º da presente contestação.

46.º
Por tudo o acima exposto, conclui-se que não estão reunidas as condições de prosseguimento do pedido [art. 89.º/1/a) do CPTA], nem, caso o juiz assim não considere, de procedência do mesmo.


E)    DA CONDENAÇÃO DOS RÉUS, SOLIDARIAMENTE, NO PAGAMENTO DE UMA INDEMNIZAÇÃO DE € 1.000.000 POR PERDA DE CHANCE E DOS JUROS MORATÓRIOS QUE À TAXA LEGAL SE VENCEREM SOBRE TAL QUANTIA DESDE A CITAÇÃO ATÉ INTEGRAL E EFECTIVO PAGAMENTO

47.º
Reafirma-se, relativamente a este pedido, a convicção de que a PI é inepta [arts. 78.º/2/g) e 89.º/1/a) do CPTA], por se tratar essencialmente da apreciação dos mesmos articulados.

48.º
Mesmo admitindo, sem conceder, que a PI não é inepta, não estão reunidos os pressupostos da responsabilidade civil extracontratual, por tudo quanto acima foi exposto.

49.º
Acresce que a condenação solidária dos Réus é desprovida de fundamento legal ou convencional.

50.º
Com efeito, a Carris não é titular de um órgão, funcionário ou agente do Estado, em termos de este poder vir a ser responsabilizado pelos actos por si praticados (art. 8.º/1 e 2 da Lei n.º 67/2007).


F)     DA CONDENAÇÃO DO MINISTÉRIO, A TÍTULO DE SANÇÃO PECUNIÁRIA COMPULSÓRIA, NO PAGAMENTO DE UMA QUANTIA PECUNIÁRIA NÃO INFERIOR A € 500 POR CADA DIA MAIS EM QUE NÃO É REMOVIDO O REGULAMENTO ANIMAIS DOMÉSTICOS DA ORDEM JURÍDICA, AO ABRIGO DO ARTIGO 44.º DO CPTA

51.º
O pedido – de sanção pecuniária compulsória de valor “não inferior a € 500” – é quantitativamente indeterminado.

52.º
Ao não estabelecer o montante da sanção pedida, o A. deixa o juiz na impossibilidade de decidir qual a quantia devida, em virtude, aliás, de não poder condenart o R. em quantidade superior do que for pedido – art. 609.º/1 do CPC.  

53.º
Nestes termos, a PI deverá ser considerada inepta e o R. absolvido da instância [arts. 78.º/2/h) e 89.º/1/a)].


II.                DO PLANO MATERIAL
A)    DA ILEGALIDADE FORMAL DO REGULAMENTO

54.º
Não se acolhendo a qualificação do direito de propriedade como um direito, liberdade e garantia, mas sim a de direito de natureza análoga aos direitos, liberdades e garantias, gozando por isso mesmo (ex vi do artigo 17.º da Constituição da República Portuguesa) do respectivo regime naquilo que nele reveste natureza análoga, desde já se reconhece a reserva de lei da Assembleia da República, ou do Governo com devida habilitação, constitucionalmente imposta pelo artigo 165º/1/b) da Constituição (doravante designada “CRP”).

55.º
Entenda-se por regulamento de execução ou complementar aquele que, para tornar possível a aplicação de uma determinada lei, desenvolve, pormenoriza ou particulariza a disciplina normativa nela contida nos termos do artigo 119º do CPA. Ademais, o regulamento de execução ou complementar é publicado em seguimento a uma lei para assegurar a respectiva execução, desenvolvendo uma tarefa de pormenorização, de detalhe e de complemento do comando legislativo, assim o entende a doutrina e a jurisprudência.

56.º
Nestes termos se acrescenta que a validade do Regulamento em análise tem por base a Lei n.º 899/2013, de 10 de Abril (v. cópia da lei que se anexa como DOC. 7 e aqui se dá por integralmente reproduzida para os devidos e legais efeitos), que dedica a sua existência à restrição do direito de propriedade pelo presente regulamento apenas pormenorizada e executada.

57.º
Em conformidade com o artigo 1.º Lei n.º 899/2013, de 10 de Abril (doravante designada “Lei n.º 899/2013), que expressamente admite a pormenorização ou complemento da mesma de forma a assegurar a respectiva execução, deve o presente regulamento ser entendido como um regulamento de execução da mesma.

58.º
Nestes termos, considera-se que o presente Regulamento é plenamente válido do ponto de vista formal.   


B)    DA ILEGALIDADE ORGÂNICA DO REGULAMENTO

59.º
Quanto à alegação do A. de que “o Regulamento foi emitido por órgão que não era para tal competente já que a matéria em causa cai na esfera de competência do Ministro do Ambiente, Ordenamento do Território, ao abrigo dos arts. 291.º/1 do CPA e 16.º/1 do Decreto-Lei n.º 119/2013”, a mesma não deve ser entendida como juridicamente relevante por desconsideração de diplomas legais que conferem legitimidade à actuação do Ministério da Agricultura e do Mar.

60.º
Como acima referido, desde já se adianta que a restrição feita ao direito de propriedade nos termos do princípio da proporcionalidade respeita à reserva de lei imposta pelo artigo 165º/1/b) da CRP, sendo a mesma restrição o resultado da criação da Lei n.º 899/2013, por órgão constitucionalmente competente para o efeito.

61.º
A Lei n.º 899/2013 dispõe que “caberá ao Ministério da Agricultura e do Mar a criação de Regulamento Próprio, desenvolvendo-se principalmente os artigos 4.º a 7.º”, devendo entender-se que a mesma carece de pormenorização e complemento com vista a atingir o seu efeito útil e finalidades próprias.

62.º
Deve desta forma ser admitida a elaboração de Regulamento de execução 123/2013 de 28 de Agosto, pelo Ministério do Ambiente, do Ordenamento do Território e da Energia, órgão devidamente competente por indicação da própria Lei 899/2013 de 10 de Abril, como exposto no supra referido artigo, enquanto regulamento que se dedica ao desenvolvimento e pormenorização da Lei 899/2013 de 10 de Abril.

63.º
Verificado que o Ministério do Ambiente, do Ordenamento do Território e da Energia era devidamente competente para a adopção de regulamento de execução, como acima referido, deve agora atender-se à emissão, pelo mesmo, do Despacho nº13322/2012 (DOC. 9 que junto se anexa e cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido para os devidos e legais efeitos) dirigido à delegação de tais poderes de criação de regulamento de execução para as matérias nela referidas, tudo isto em estrita observância dos requisitos e pressupostos legalmente exigidos, atendo que lhe subjaz a Lei (habilitante) n.º 755/2013, de 22 de Fevereiro (DOC. 10 que junto se anexa e cujo contéudo se dá por integralmente reproduzido para os devidos e legais efeitos).


C)    DA ILEGALIDADE MATERIAL DO REGULAMENTO
a.      DA PROPORCIONALIDADE DAS MEDIDAS

64.º
Alegou A. que o supra referido Regulamento impõe restrições a direitos, liberdades e garantias, maxime, direito de propriedade, previsto e protegido no artigo 61.º/1 da CRP, designadamente sobre o direito de propriedade do A. sobre os animais (v. articulado 40 da PI), apreciação que desde já se advoga ser desprovida de adequado fundamento legal, pois a norma alegada, o artigo 61º/1 da CRP, dedica a sua previsão a objecto que não o direito de propriedade privada mas sim à livre iniciativa privada, cooperativa e autogestionária.

65.º
Sem conceder, mas querendo o tribunal conhecer do mérito da alegação desprovida de fundamento legal acima referida, deve o mesmo atender ao facto de a referida restrição ter sido criada por Lei, sendo a revelia ao princípio da proporcionalidade das suas normas da inteira responsabilidade do órgão que as emitiu, ou seja, a Assembleia da República.

66.º
Quanto à proporcionalidade das normas do Regulamento do Ministério, alega o A. que “as medidas relativas ao número máximo de animais domésticos e o número de vezes que os animais devem ser passeados não são consentâneas com o princípio da proporcionalidade”, insuficientemente concretizando que “as referidas medidas, ao serem fixadas em abstrato e desacompanhadas de quaisquer outros critérios, são inadequadas aos fins que prosseguem e demasiado onerosas e gravosas para os particulares, ao arrepio do corolário da razoabilidade, daí resultando uma inconstitucionalidade material” (v. articulados 41 e 42 da PI).

67.º
Certo é, nos termos do n.º 1 daquele artigo 62° da CRP, que "a todos é garantido o direito à propriedade privada e à sua transmissão em vida ou por morte, nos termos da Constituição". Contudo, segundo Jorge Miranda, in Constituição Portuguesa Anotada, Tomo I, 2005, pág. 629, “da circunstância do artigo 62.º não estabelecer restrições explícitas à propriedade não pode extrair-se que elas sejam vedadas. […] Somente numa visão quimérica da Constituição liberal radical se pretenderia que a propriedade não pudesse ser restringida senão nos casos nela directa e expressamente contemplados e se entenderiam proibidas quaisquer normas legais restritivas que lhes não correspondessem. Pelo contrário, qualquer Constituição positiva, ainda que imbuída de respeito pela propriedade, tem de admitir que a lei declare outras restrições – até por não poder prever ou inseri-las todas no texto constitucional. O que a lei também aqui tem de respeitar é o feixe de regras do artigo 18.º atrás estudadas.”

68.º
Segundo Freitas do Amaral, “constitui uma manifestação constitutiva do princípio do Estado de Direito (artigo 2.º CRP), ou seja, num Estado de Direito democrático, o poder público tem de ser exercido por forma a não ultrapassar o estritamente necessário para a realização do interesse público” (in Diogo Freitas do Amaral, Curso de Direito Administrativo, Almedina 2003, Vol. II, págs. 127 e 129).

69.º
Mais concretamente, “a proporcionalidade é o princípio segundo o qual a limitação de bens ou interesses privados por actos dos poderes públicos deve ser adequada e necessária aos fins concretos que tais actos prosseguem, bem como tolerável quando confrontada com aqueles fins, tendo como dimensões fundamentais, a adequação, a necessidade e o equilíbrio” (idem).

70.º
Neste sentido, adequação significa que a medida administrativa deve ser ajustada ao fim que se visa atingir com o acto administrativo, a necessidade significa que dentro das medidas abstractamente idóneas para atingir o fim que se prossegue com o acto administrativo, deve-se escolher aquela que for menos lesiva em relação aos direitos e interesses dos particulares, e, finalmente, a vertente do equilíbrio (proporcionalidade em sentido estrito) significa que os benefícios que se esperam alcançar com uma medida administrativa adequada e necessária suplantem, à luz de condições materiais, os custos por ela acarretados.

71.º
Assim, foi o Ministério da Agricultura e do Mar diligente o suficiente para contratar com entidades independentes para examinar da proporcionalidade da medida, requisitando, nomeadamente que:

i)                    o conjunto de medidas adoptadas fosse (por um centro de estatísticas) comparado com outras medidas possíveis para atingir os mesmos fins;
ii)                  fosse elaborada um Business Plan por gestor independente, capaz de aferir os possíveis custos  e benefícios daquelas medidas;
iii)                examinados os resultados dos pedidos acima referidos, fosse elaborado um parecer jurídico por um jurista de renome
(como comprovam os DOCS. 2 e 3, 4 e 5, e 6 e 7, cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido para os devidos e legais efeitos).

72.º
Ora, do relatório estatístico apresentado por CEIPCRPP – CENTRO DE ESTATISTICAS INDEPENDENTE PARA CONFUSÕES RELACIONADAS COM O PRINCIPIO DA PROPORCIONALIDADE, Lda. (empresa independente e sem ligação às partes envolvidas, que desenvolve a sua actividade em colaboração com juristas) resultaram os dados abaixo transcritos (DOC. 2, cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido para os devidos e legais efeitos), concluindo-se que:

73.º
“Existem outras medidas também aptas a prosseguir o mesmo fim de interesse público pretendido pelo Regulamento”.

74.º
“Das medidas encontradas, nenhuma poderia seria mais eficaz do que aquela que foi adoptada pelo Ministério da Agricultura e do Mar, nunca se conseguindo, pela a adopção das mesmas, atingir tal finalidade da forma igualmente eficaz sem lesar o direito de propriedade e o direito ao livre desenvolvimento da personalidade dos cidadãos de forma menos gravosa”.

75.º
Ademais, por virtude do relatório apresentado por JOÃO TIAGO – GESTOR COM VOCAÇÃO PARA TAL, Unipessoal resultaram os dados que seguidamente se transcreve (DOC. 4, cujo conteúdo se dá como integralmente reproduzido para os devidos e legais efeitos), concluindo-se que:

76.º
“Os benefícios que serão atingidos por virtude da adopção das medidas propostas justificam a adopção mesmas e respectivos custos”.

77.º
Sem conceder, opte o tribunal por considerar insuficientes as diligências adoptadas pelo Ministério para aferir do preenchimento dos pressupostos processuais do princípio da proporcionalidade, deve ainda atender-se às razões que ainda assim justificariam a adopção das referidas medidas no regulamento de execução emitido pelo Ministério.

78.º
Esclarecendo o tribunal, como se decidiu no Acórdão do Tribunal Constitucional nº 11/83, de 12 de Outubro (DR, II série, de 20.10.83), “o princípio do Estado de Direito Democrático não é postergado quando razões imperiosas de interesse público se sobreponham visivelmente à tutela dos valores da segurança e de certeza jurídicas”. Ora, na situação sub judice é manifesto que os interesses aos quais o regulamento atende servem o propósito de proteger valores de fundamental relevo e interesse público, com a mesma ou superior dignidade relativamente à dos interesses necessariamente sacrificados, nomeadamente, a defesa e promoção da saúde por virtude da criação de condições ambientais condignas [artigo 64.º/2/b) da CRP]; a protecção e valorização da natureza e do ambiente previsto [artigo 9.º/e) da CRP]; um ambiente e qualidade de vida sadios e ecologicamente equilibrados (66.º/1 da CRP); a efectivação do direito dos cidadãos a uma habitação em condições de higiene e conforto (65.º/1 da CRP).

79.º
Estes são interesses de fundamental valia e interesse público, a reclamar urgente protecção e satisfação, justificando-se plenamente, para a sua afirmação, o sacrifício de outros interesses, como os da segurança do ordenamento jurídico e da protecção da norma, sem que esse sacrifício possa qualificar-se como intolerável, inexigível ou desproporcionado.

80.º
Note-se ainda que o regulamento visa a garantia dos princípios básicos para o bem-estar dos animais, nos termos dos artigos 7.º/1 e 8.º/1/a) do Decreto-Lei n.º 276/2001, de 17 de Outubro, que põe em execução o Decreto-Lei n.º 13/93, de 13 de Abril, que aprova a Convenção Europeia para a Protecção dos Animais de Companhia em Portugal, visando assegurar que os parâmetros de bem-estar animais são garantidos por virtude do cumprimento de determinadas regras para que os mesmo disponham do espaço adequado às suas necessidades fisiológicas e etológicas.

b.      DO LIVRE DESENVOLVIMENTO DA PERSONALIDADE

81.º
Alega ainda o A. que as medidas adoptadas pelo Ministério no Regulamento de execução ferem de forma inadmissível o direito ao livre desenvolvimento da personalidade, previsto no art. 26.° da CRP, nomeadamente por não se permitir que o A. coabite com todos os seus animais e que possa, com estes, exercer o animalismo (v. articulado 40 da PI).

82.º
Ao consagrar um direito ao livre desenvolvimento da personalidade, a CRP inspirou-se no art. 2.º/1 da Lei Fundamental Alemã, que dispõe que “todos têm direito ao livre desenvolvimento da sua personalidade desde que não violem os direitos dos outros nem infrinjam a ordem constitucional e a lei moral”.

83.º
Porém, como referem Rui Medeiros e António Cortês, in Constituição Portuguesa Anotada, Tomo I, 2005, págs. 286 e segs., “no direito alemão o direito ao livre desenvolvimento da personalidade constitui o princípio de irradiação de todos os direitos pessoais não especificados, entre os quais se contam quase todos os que estão expressamente consagrados no texto português”. Assim, no direito português o alcance prático deste direito será muitíssimo mais restrito do que no direito alemão.

84.º
Densificando o alcance deste direito, a expressão portuguesa “desenvolvimento da personalidade” está ligada à ideia de “formação de personalidade” que se encontra também parcialmente no artigo 70.º/2 da CRP, onde se refere o “desenvolvimento da personalidade dos jovens” como objectivo da política da juventude.

85.º
Nestes termos, ao invés de se considerar que a restrição dos número de animais domésticos que podem habitar com as pessoas é contrária ao livre desenvolvimento da personalidade, deve entender-se que as medidas do Regulamento visam criar as condições necessárias para um mais livre e saudável desenvolvimento da personalidade de todas as pessoas.

86.º
Já acima se disse que o RAD tem como finalidades a defesa e promoção da saúde por virtude da criação de condições ambientais condignas [art. 64.º/2/b) da CRP], um ambiente e qualidade de vida sadios e ecologicamente equilibrados (art. 66.º/1 da CRP) e a efectivação do direito dos cidadãos a uma habitação em condições de higiene e conforto (art. 65.º/1 da CRP), em que o direito ao livre desenvolvimento da personalidade se concretiza.

87.º
Para fundamentar melhor a inexistência da violação alegada, deve firmar-se o entendimento a liberdade geral de acção não é um direito, liberdade e garantia em si mesma. Isso implicaria que toda e qualquer norma jurídica tivesse de provir da Assembleia da República porque todas elas contendem, em maior ou menor medida, com a liberdade de acção dos particulares.

88.º
Por tudo o acima exposto, considera-se, não só infundada, mas também inexistente, a violação do direito previsto no art. 26.º da CRP, concluindo-se pela validade material do Regulamento em análise.


Nestes termos e nos demais de direito aplicáveis se requer a V. Exa. que se digne a absolver o R., com base na presente contestação, de todo e qualquer pedido por A. instaurado, devendo considera-se o Ministério competente para criar o Regulamento 123/2013, e estando o mesmo conforme aos moldes constitucionalmente impostos.

E.D.

Os Advogados,

Carolina Pitta e Cunha                Duarte Martins                             Duarte Viegas 

Lourenço Barbosa                               Margarida Barreto                        Pedro Sá e Melo
                                       

Rodrigo Miranda

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