Exmos. Senhores
Juízes de Direito do
Tribunal Administrativo e Fiscal de Círculo de Lisboa
Noé das Arcas, com domicílio na Rua Augusta, nº 39, 3º Direito, 1149,
Lisboa, de ora em diante designado por Autor, representado por Ana Luísa Melo,
Catarina Almeida, Filipa Portella, Inês Graça, João Perdigão, Joana Francisco,
José Marcão e Raquel Boularot
Vem instaurar
Contra
Ministério da Agricultura e do Mar, sedeado na
Praça do Comércio, 1149-010, Lisboa, de ora em diante designado por
“Ministério”
e
Companhia Carris de Ferro de Lisboa, S.A., com sede na
Rua 1º de Maio, nº103, 1300-427 Lisboa, de ora em diante designado por “Carris”
A presente acção
administrativa especial com processo comum, nos termos e com os fundamentos
seguintes
I - DOS FACTOS
§1
O A. é titular
de uma fracção de prédio urbano de 2 assoalhadas, sito na Rua Augusta, nº39, 3º
D, fracção que perfaz uma área de 550 metros quadrados.
§2
Desde 2010, é
proprietário de: 4 macacos, 4 gatos, 4 cães, 4 periquitos, 4 araras, 4
hamsters, 4 tartarugas, 4 cobras de água, 4 lagartos, 3 enxames de mosquitos, 2
enxames de moscas, 5 formigueiros, 2 barateiros e 8 agrupamentos de aranhas.
§3
Os animas supra
referidos vivem na mesma fracção que o A.
§4
No dia 1 de
Setembro de 2013, em Assembleia de Condóminos, Albertina da Encarnação,
moradora do 10º E e administradora do condomínio do prédio sito no nº39 na Rua
Augusta, trouxe ao conhecimento do A. e demais condóminos, o Regulamento do
Animal Doméstico.
§5
Em reacção às
normas constantes do regulamento, gerou-se uma fervorosa e polémica discussão entre o A. e Albertina da
Encarnação.
§6
No calor da
discussão, o A. desmaiou tendo caído sobre uma mesa de vidro e metal,
vindo a sofrer múltiplos ferimentos corporais, escoriações e um traumatismo
craniano.
§7
O A. é um idoso
de 63 anos que sofre de pressão arterial elevada, diabetes e fraqueza muscular
nos limbos inferiores.
§8
O A. foi levado
de ambulância para o Hospital Santa Maria onde os médicos declararam ter
sofrido um Acidente Vascular Cerebral (AVC),
§9
O A. ficou
internado no Hospital de Santa Maria durante 20 dias, em coma induzido para
evitar mais lesões cerebrais.
§10
Apesar do
transtorno causado e das repercussões quer a nível físico, quer emocional, o A.
conseguiu recuperar, tendo alta hospitalar dia 21 de Setembro de 2013.
§11
Durante o
período de internamento do A., os animais que este mantinha na sua fracção
ficaram abandonados e sem os cuidados de que necessitavam.
§12
Quando A. chegou
a casa, terminado o período de internamento, deparou-se com morte da maioria
dos seus animais domésticos.
§13
Apenas
sobreviveram três cães, dois macacos, quatro cobras de água e um gato.
§14
Perante tais
factos, a angústia e sofrimento do A. eram evidentes.
§15
O A. sofreu uma
alta deterioração da sua saúde em consequência da perturbação sofrida, estando
em causa um trauma que se vai manter e repercutir na sua vivência diária e
quotidiano.
§16
O A. continuou,
contudo, a manter a sua profissão e prosseguiu com o exercício da sua
actividade.
§17
O Autor, antigo
investigador na área das ciências ocultas e biólogo, é um prestador de serviços
liberal.
§18
A sua actividade
consiste na prestação de consultas de acompanhamento espiritual e comunicação
esotérica, por recurso à Animalioterapia.
§19
O A. realiza as
suas sessões no seu consultório, no Palácio da Ajuda, Largo da Ajuda, Lisboa.
§20
O meio de transporte
utilizado pelo A. é o eléctrico.
§21
O A. não possui
um automóvel por motivos ambientais.
§22
A utilização dos
transportes públicos da Carris nunca havia sido recusada ao A., que viajava
sempre na companhia dos seus animais.
§23
No dia 2 de
Outubro de 2013, às nove horas e vinte minutos, o A. deslocou-se à paragem do
eléctrico n°28, explorado pela Carris, na Praça Luís de Camões, para apanhar o
eléctrico até ao Palácio da Ajuda.
§24
O A. pretendia
realizar, às dez horas, no seu consultório, uma sessão de Animaloterapia com o xeque
Al Alibibi O’ Alibabá.
§25
Ao tentar entrar
no eléctrico, por volta das nove horas e vinte e cinco minutos, o A. foi
impedido de o fazer na companhia dos seus animais.
§26
Os animais que
trazia consigo eram três cães e um gato.
§27
O A. necessitava
dos animais para a sua sessão de Animaloterapia com o xeque Al Alibibi.
§28
Os cães por que
se fazia acompanhar eram os dois de raça Yorkshire Terrier, sendo de porte
pequeno;
§29
Os cães estavam,
cada um, dentro da sua caixa para transporte.
§30
O gato era de
raça Siamesa e encontrava-se, também ele, dentro de uma mala de transporte
específica para gato.
§31
Foi alegado,
pelo motorista do eléctrico, que estaria em vigor um Regulamento interno emitido
pela Carris no dia 15 de Setembro de 2013, que impunha as condições de
admissibilidade de utilização dos transportes públicos da Carris na companhia
de animais domésticos.
§32
Perante a recusa
por parte da Carris em que entrasse no eléctrico, o A. viu-se obrigado a ficar
na Praça Luís de Camões, ao invés de ser transportado para o lugar do seu
destino.
§33
Havendo greve do
metro e de autocarro, o A. teve que ir a pé até ao seu Consultório, tendo lá
chegado às 14h.
§34
O xeque Al
Alibibi havia-se deslocado a Lisboa naquele dia para ser espiritualmente
iluminado pelo A., regressando a Abu Dhabi às catorze horas do mesmo dia.
§35
Foi acordado
entre o A. e o xeque Al Alibibi que a sessão de Animaloterapia revestia o
valor de um milhão de euros.
II -DE DIREITO
§36
O A. vem
intentar, no Tribunal Administrativo e Fiscal de Círculo Lisboa, esta acção sob
forma administrativa especial com processo comum, formulando os seguintes
pedidos:
a)
Declaração de ilegalidade com força obrigatória geral do Regulamento
Animais Domésticos
b)
Declaração de ilegalidade do regulamento interno da Carris
c)
Declaração de nulidade ou anulabilidade do acto material de
recusa da Carris
d)
Condenação do Ministério no pagamento de uma indeminização de
30 000€ por danos não patrimoniais e ainda de juros moratórios que à taxa legal
se vencerem sobre tal quantia desde a citação até integral e efectivo pagamento
e)
Condenação do Ministério no pagamento de uma indeminização de
20 000€ por danos patrimoniais e ainda de juros moratórios que à taxa legal se
vencerem sobre tal quantia desde a citação até integral e efectivo pagamento
f)
Condenação dos Réus, solidariamente, no pagamento de uma
indemnização de 1 000 000€ por perda de chance e ainda de juros moratórios que
à taxa legal se vencerem sobre tal quantia desde a citação até integral e
efectivo pagamento
g)
Condenação do Ministério, a título de sanção pecuniária
compulsória, no pagamento de uma quantia pecuniária não inferior a 500€ por
cada dia mais em que não é removido o Regulamento Animais Domésticos da ordem
jurídica, ao abrigo do art.°44 do CPTA
§37
Do plano
substantivo:
§38
O Regulamento
Animal Doméstico está inquinado por vício orgânico, material e de formal.
§39
O Regulamento
foi emitido por órgão que não era para tal competente já que a matéria em causa
cai na esfera de competência do Ministro do Ambiente, Ordenamento do
Território, ao abrigo dos art.°29n°1 CPA e art.°16-An°1 do DL 119n°2013.
§40
No que concerne à
matéria, o regulamento impõe restrições a direitos, liberdades e garantias,
maxime, direito de propriedade, previsto e protegido o art.°61°n°1 da CRP,
designadamente sobre o direito de propriedade do A. sobre os animais e ainda,
direito ao livre desenvolvimento da personalidade, previsto no art.°26° da CRP,
nomeadamente por não se permitir que o A. coabite com todos os seus animais e
que possa, com estes, exercer o animalismo.
§41
As medidas
relativas ao número máximo de animais domésticos e o número de vezes que os
animais devem ser passeados não são consentâneas com o princípio da
proporcionalidade – vide art.° 18°n°2 CRP.
§42
As referidas medidas,
ao serem fixadas em abstrato e desacompanhadas de quaisquer outros critérios,
são inadequadas aos fins que prosseguem e demasiado onerosas e gravosas para os
particulares, ao arrepio do corolário da razoabilidade, daí resultando uma
inconstitucionalidade material.
§43
A limitação de
direitos, liberdades e garantias é, segundo o art.°164°n°1n°b) CRP, do âmbito
de reserva de lei da Assembleia da República ou do Governo, havendo devida
habilitação.
§44
Donde,
revestindo a forma regulamentar, o acto normativo padece de um vício formal,
sendo inconstitucional também por essa via.
§45
Pelo que há que
concluir pela ilegalidade do Regulamento Animais Domésticos.
§46
O regulamento interno da Carris é
igualmente ilegal por ter por fundamento jurídico um acto normativo que padece
de ilegalidade – o Regulamento Animais Domésticos – que assim o contamina.
§47
O acto material de recusa da Carris
é nulo porque carreado sem o necessário fundamento jurídico válido que o
legitimasse, de acordo com o princípio da legalidade que vale no âmbito do
direito público.
§48
O Ministério deve ressarcir o A. em
trinta mil euros por danos não patrimoniais e 20 000€ por danos patrimoniais
emergentes de ilícito administrativo decorrente da emissão do Regulamento
Animais Domésticos, nos termos dos art.°2° n°1 e n°2, art.° 3 n°1, n°2 e n°3 +
art.° 7° n°1 + art.° 8° n°1 + art.° 9° n°1 + art.° 10° n°1 do Anexo à Lei n°67/2007.
§49
O facto é ilícito porque inquinado
por várias ilegalidades nos termos que acima se explanou, culposo atento que a
Ministra representou e quis emanar um regulamento em contravenção da lei,
danoso como decorre dos elementos fácticos, verificando-se nexo de causalidade
na medida em que o regulamento era em termos abstratos e foi-o em concreto
idóneo à provocação dos danos.
§50
Os danos não patrimoniais que a
este título se pendem têm que ver com as mazelas físicas sofridos pelo A em
virtude do acidente e ainda a angústia e a dor causada pela morte dos animais,
a sua fonte de viver.
§51
Os danos patrimoniais são
reconduzíveis ao valor económico dos animais que faleceram e que, portanto,
determinaram não só uma diminuição imediata da esfera patrimonial do A. como
uma castração parcial da sua principal fonte de rendimento futura.
§52
Como consequência do acto material
da Carris, o A. deixou de auferir um milhão de euros da sessão com o xeque.
§53
Esse dano é imputável ao Ministério
e à Carris já que decorrente das ilegalidades dos regulamentos, havendo culpa
de ambas as entidades na medida em que ambas representavam e quiseram perpetrar
os ilícitos administrativo que desembocaram no acto material, há nexo de
causalidade em cadeia visto serem os dois regulamentos e o acto material
sucessivamente idóneos em abstrato e em concreto à produção do dano, e o evento
foi danoso porque determinou que o A. ficasse precludido de receber aquele
montante que de contrário entraria por certo na sua esfera jurídica.
§54
Logo, firma-se a obrigação de
indemnizar o lesado, nos termos do art.°2°n°1 en°2 + art.°3°n°1, n°2 e n°3 + art.°7°n°1
+ art.°8°n°1 + art.°9°n°1 + art.°10°n°1 do Anexo à Lei n° 67/2007.
§55
Do plano
processual:
§56
No que concerne
à competência do Tribunal, é competente o Tribunal Administrativo e Fiscal de
Círculo de Lisboa atento que, em função da hierarquia, os pedidos por ora
formulados não estão previstos no âmbito de competência do Supremo Tribunal
Administrativo ou dos Tribunais Centrais Administrativos, nos termos e para os
efeitos do art.°24°n°1 ETAF e art.°34° ETAF, caindo na esfera residual de
competência do tribunal administrativo de círculo ao abrigo do art.°44°n°1
ETAF; em razão do território, a acção cai sob alçada do tribunal de Lisboa, o
que se decalca da conjugação dos art.°16° e art.°18°n°1 do CPTA e ainda mapa
anexo ao DL n°325/2003 de 29 de Dezembro.
§57
O A. dispõe de
legitimidade activa no processo, ao abrigo dos art.°9°n°1, art.°55°n°1 a) e art.°73°n°1
e 2 do CPTA, por ser parte nas relações controvertidas com o Ministério e com a
Carris, em razão da titularidade de direitos subjectivos, maxime, direito de
propriedade, direito ao livre desenvolvimento da personalidade e direito à integridade
física e moral, lesados em virtude da aplicação das normas constantes dos
regulamentos e dos efeitos que daí decorrem, sendo que quanto ao regulamento
interno da Carris, as normas jurídicas imediatamente exequíveis.
§58
As entidades demandadas
são-no por, nos termos do art.°10°n°1, n°2, n°5 e n°7 por constituírem a outra
parte nas relações controvertidas, o Ministério, por ser a Ministra o órgão a
quem é imputável o Regulamento Animais Domésticos e a Carris, enquanto
sociedade comercial a quem é reconduzível o regulamento interno e o acto
material que nesta acção se impugnam.
§59
Estabelece-se
uma cumulação de pedidos por recurso aos art.°4° n°1 a), n°2 b), f), n°3 e n°5
do CPTA tendo por fundamento, em primeiro lugar, a relação de dependência que
estabelece entre o Regulamento Animal Doméstico e o Regulamento interno, em
segundo, ser a mesma a causa de pedir, por um lado, dos pedidos supra referidos
nas alíneas a), d), e), f) e g), in casu, o Regulamento Animais Domésticos; por
outro, dos pedidos acima mencionado nas alíneas b) e f), maxime o Regulamento
interno.
§60
Tem-se assim uma
coligação ao abrigo do art.°12° n°1 a) e n°2 do CPTA, assinalando-se que os
demais requisitos da coligação que se decalcam dos art.°37° e 555° do CPC – a
compatibilidade processual quanto competência internacional, matéria e
hierarquia e compatibilidade substantiva – estão reunidos.
§61
Há uma relação
de litisconsórcio voluntário ao abrigo dos art.°517° n°1 CC e art.°32° n°1 CPC
no tocante ao pedido de indemnização por perda de chance.
§62
Os pedidos de
indemnização, de acordo cn° o art.°37° n°2 d) e f) do CPTA, seriam
reconduzíveis à acção administrativa comum, e por sua vez, os pedidos de
anulação do acto material e as declarações de ilegalidade e condenação ao
pagamento de sanção pecuniária compulsória à acção administrativa especial, ao
abrigo do art.°46° n°1 e 2 a) e c) do CPTA.
§63
Utiliza-se a
acção administrativa especial em virtude da cumulação de pedidos – vide art.°47°
n°1 do CPTA.
§64
No tangente aos
pressupostos processuais específicos da impugnação de normas regulamentares
tem-se que:
§65
Quanto ao pedido
declaração de ilegalidade com força obrigatória geral do Regulamento Animais
Domésticos, ao abrigo dos art.°73° n°1 e art.°74° do CPTA, o mecanismo
aplica-se por já ter havido três sentenças de desaplicação ao caso concreto e
visto que quanto à oportunidade do pedido, este não se encontrar sujeito a
prazo.
§66
Relativamente à declaração de
ilegalidade do regulamento interno da Carris, nos termos do art.°73° n°2
verifica-se o pressuposto da imediata exequibilidade e de acordo com o art.°74°,
a acção é tempestiva.
§67
Nestes termos e
demais de direito aplicáveis, deve a acção ser julgada procedente.
Valor a acção: um
milhão e cinquenta mil euros (1 050 000€), acrescidos de juros moratórios à
taxa legalmente aplicável.
Citação da Ré
promovida por:
Ana Luísa Melo,
Catarina Almeida, Filipa Portella, Inês Graça, Joana Francisco, José Marcão e
Raquel Boularot, mandatários do Autor na presente acção, domiciliados na
Universidade Católica, Palma de Cima, Lisboa
O nosso colega João Perdigão também faz parte da defesa de Noé, mas devido a um lapso tal informação só consta no início da petição e não no final.
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