Exmos.
Senhores Juízes de Direito do
Tribunal
Administrativo e Fiscal de Círculo de Lisboa
Noé das
Arcas, com domicílio
na Rua Augusta, nº 39, 3º Direito, 1149, Lisboa, de ora em diante designado por
Autor, representado por Ana Luísa Melo, Catarina Almeida, Filipa Portella, Inês
Graça, João Perdigão, Joana Francisco, José Marcão e Raquel Boularot,
Vem instaurar contra
Companhia
Carris de Ferro de Lisboa, S.A.,
com sede na Rua 1º de Maio, nº103, 1300-427 Lisboa, de ora em diante designado
por “Carris”,
Uma PROVIDÊNCIA DE
SUSPENSÃO DE UM ACTO ADMINISTRATIVO OU DE UMA NORMA, para suspensão do
Regulamento Interno emitido pela Carris na sequência do regulamento “Animais
Domésticos”, na pendência do processo principal, ao abrigo dos artigos 130 e
112 e seguintes do Código de Processo dos Tribunais Administrativos (doravante
CPTA),
I – Dos factos
1º
Noé constituiu-se
como profissional liberal, trabalhando como medium
e guia espiritual. Para conceder a ajuda que lhe requerem, Noé apoia-se e
inspira-se em alguns animais, que representam para si um meio de contacto com o
além.
2ª
Noé tinha
contratado com o Xeique Al Alibibi O´ Alibaba uma prestação de serviços com
recurso a animais, no valor de um milhão de euros.
3º
Noé estava
acompanhado de dois cães e um gato, cumpria todas as condições de segurança e
sanidade necessárias para o transporte de animais em transportes públicos
urbanos. Os animais tinham, aliás, sido desparasitados pelo veterinário no
mesmo dia, tendo o veterinário lhes dado banho nessa manhã;
4º
Para este
efeito, no dia dois de Outubro de dois mil e treze, pelas nove horas e vinte
minutos, Noé dirigiu-se ao eléctrico nº28 da CARRIS, na paragem da Praça Luís
de Camões, Lisboa, como sempre faz;
5º
Apesar dos
factos supra citados, Noé foi impedido de entrar no eléctrico e por
conseguinte, de se deslocar até ao seu pretenso destino;
6º
O funcionário
que impediu Noé de entrar no veículo invocou o regulamento interno emitido pela
Carris a quinze de Setembro de dois mil e treze.
7º
O Autor não
dispõe de outro meio de transporte alternativo. Não tem habilitação legal para
conduzir, uma vez que não possuí carta de condução;
8º
Acresce o facto
de o elétrico ser o único meio de transporte que circula de janelas abertas,
reunindo as condições necessárias ao transporte saudável dos animais;
9º
A proibição em
causa, para além dos constrangimentos óbvios de quem se vê impedido de se
transportar para onde deseja, fez com que Noé incumprisse o contrato a que
estava vinculado com o Xeique Alibibi, estando os prejuízos, respeitantes a
este dia, avaliados em um milhão de euros;
10º
O Autor continua
a exercer a sua profissão liberal com carácter de habitualidade, pelo que
continuará a ser-lhe indispensável a circulação no eléctrico;
11º
Contudo,
sistematicamente a sua entrada no eléctrico tem sido recusada com fundamento no
regulamento;
12º
Desta forma, Noé
tem sofrido constantes perturbações no exercício da sua actividade profissional
com os inerentes danos;
13º
Durante a
vigência do regulamento, é expectável que a circulação lhe continue a ser
negada, prevendo-se a continuação das perturbações profissionais acima
referidas;
II – De direito
14º
Não obstante o
decurso da acção principal, é possível, nos termos do art.º 112 n.º 1, recorrer
à tutela cautelar como forma de assegurar a utilidade da sentença a proferir;
15º
Como refere o
art 114 n.º1 c), esta providência pode ser solicitada, desde que em
requerimento próprio, na pendência do processo principal;
16º
O presente tribunal é competente em
razão da matéria segundo o art. 1º e o art. 4º nº1 al. e) do Estatuto dos
Tribunais Administrativos e Fiscais, e é competente territorialmente nos termos
do artigo 16º CPTA e o meio processual é o idóneo. Também é competente para
conhecer da providência segundo o art. 132º nº3 e 114º nº 2 do CPTA.
17º
A providência
cautelar em causa encontra-se estipulada nos art.º112° n.º2 a) e no art.º130,
sendo exigível que ocorram os dois requisitos essenciais – fumus
boni iuris e periculum in mora –
do art.º 381° do CPC.
18º
Acrescem aos
requisitos gerais os do art.º 120° n°1 al. b), como sendo o fundado receio da
constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de
difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo
principal; e não seja manifesta a falta de fundamento da pretensão formulada ou
a formular nesse processo ou a existência de circunstâncias que obstem ao seu
conhecimento de mérito.
19º
O regulamento
interno da Carris, cuja eficácia se pretende ver suspensa, tem como fonte o
Regulamento nº1234/67, emitido pelo Ministério da Agricultura e do Mar.
20º
Como referido no processo principal, ao
qual se apensa a presente providência, o Regulamento nº1234/67 está ferido de
ilegalidade orgânica, material e formal.
21º
Da ilegalidade orgânica:
O Regulamento foi emitido pelo
Ministério Agricultura e do Mar. Contudo, segundo o art.º 29º nº1 do art.º CPA
e o art.º 16º-A da Lei Orgânica do presente Governo, este não é competente para
a regulamentação desta matéria. Seria competente o Ministério do Ambiente, da
Agricultura e do Mar.
22º
Da ilegalidade material e formal:
O Regulamento, a suspender por este
Tribunal, estabelece restrições no âmbito de direitos, liberdades e garantias, maxime ao direito de propriedade. Este
direito fundamental é protegido constitucionalmente pelo art.º61ºnº1 da
Constituição da República Portuguesa, e, como tal, segundo o art.º17º e o
art.º165 da Constituição, só poderá ser restringido mediante lei formal.
23º
Assumindo a dependência entre ambos os
pedidos, e decretada, como se espera, a ilegalidade do regulamento Ministerial,
será também procedente o pedido de ilegalidade relativo ao Regulamento da
Carris.
24º
Com efeito, por via da ilegalidade
demonstrada, não há qualquer restrição que obste ao direito de Noé usufruir dos
transportes públicos em causa. Verifica-se desta forma a aparência do direito
invocado.
25º
No que ao periculum in mora respeita, são expectáveis danos semelhantes aos
descritos nos artigos 10º a 13º da presente peça processual. Deste modo, não se
poderá esperar até à decisão judicial da petição principal, sob pena de grave
prejuízo para o autor.
26º
Note-se que os contratos supra referidos
correspondem a prestações com prazo certo, e que os danos daí provenientes são
dificilmente reparáveis, nomeadamente pela elevada quantia que representam.
27º
Uma vez verificados, no caso concreto,
os pressupostos da tutela cautelar, não se configuram obstáculos à procedência
desta ação.
28º
Estando reunidos as condições
necessárias para o conhecimento deste pedido, e demonstrada a fundamentação do
mesmo, pede-se a este Tribunal que decrete, com a máxima celeridade possível, a
suspensão de eficácia do regulamento interno da Carris.
Em mandato judicial e como advogados de Noé das Arcas, com procuração já apresentada neste Tribunal e anexada a esta peça processual, Ana Luísa Melo, Catarina Almeida, Filipa Portella, Inês Graça, Joana Francisco, José Marcão e Raquel Boularot, João Perdigão, domiciliados na Universidade Católica, Palma de Cima, Lisboa.
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